O povo Tapeba, uma das 15 etnias do estado do Ceará, localiza-se no município de Caucaia, na região metropolitana de Fortaleza. Sua população é de 8.010 indígenas, distribuídos em 17 aldeias, na Terra Indígena (TI) Tapeba, um território de 5.294 hectares. Os Tapeba foram um dos primeiros povos a se afirmarem e se autodeclararem indígenas no Ceará – sua luta começou em 1980. A partir daquele momento, iniciou-se uma luta árdua pela terra. De acordo com o relato de João Kennedy, uma das lideranças tapeba, o povo está em conflito com uma das oligarquias do município de Caucaia, a família Arruda Coelho. Esse conflito se iniciou em 1997 e, durante longos anos, os Arruda tentaram retardar o processo demarcatório da TI Tapeba. Segundo Kennedy, os Arruda se dizem donos de uma área dentro do território indígena, a fazenda Soledade. Em função dos conflitos judiciais, que se estenderam por anos, para que o processo de demarcação destravasse, foi estabelecido um acordo, elaborado pela Fundação Nacional do Índio (Funai), que estipulou a redução em 10% da extensão da TI (544 hectares). Caso o acordo fosse firmado, a família Arruda se comprometeria a desistir das ações judiciais contra a demarcação. De início, os Tapeba não concordaram e não aceitaram o acordo. Eles afirmaram que a proposta era imoral e indecente, pois a redução da TI afetaria a aldeia da Ponte. Entretanto, após um ano de negociação, as lideranças decidiram que iriam ceder os 10%, pois uma das grandes lideranças do povo Tapeba, a Pajé Raimunda, decidiu que preferia ver a terra de seu povo demarcada, mesmo que eles tivessem que perder uma parte dela. Dessa forma, os Tapeba construíram os seus critérios para a concretização do acordo. Em contrapartida, exigiram a recuperação do rio Ceará; a retirada das famílias da área de risco; a construção de casas para a alocação dessas famílias, de escolas, posto de saúde e vias de acesso para o rio e para outras comunidades; e, sobretudo, celeridade no processo demarcatório, com a homologação da TI e a extrusão dos ocupantes não indígenas. Kennedy nos relatou que, durante o processo contra a família Arruda, as lideranças não foram ameaçadas, mas as ações judiciais que retardavam a demarcação da TI constituíam uma ameaça contra todo o povo. É complexo observar como as violações acontecem e como elas terminam, pois, mesmo com longos anos de luta para que possamos avançar no que tange à conquista da terra, nós, povos indígenas, precisamos perder para que possamos ganhar. Isso é o resultado das falhas do Estado, que não preza pelos direitos dos povos indígenas, que investe para vulnerabilizar a luta, com o intuito de favorecer os não indígenas. Nesse caso, a demarcação da TI, que deveria ter sido a efetivação de um direito, significou também uma violação. Inicialmente, os Tapeba não aceitaram o acordo, porque tinham ciência de quanto ele feria os seus direitos. Mas, como se viram vulneráveis, com a perspectiva de viverem mais tempo uma árdua luta judicial, e diante da atual conjuntura, em que o governo federal é totalmente contrário aos direitos indígenas, eles mudaram de posição. Quando se analisa a conjuntura e a luta construída ao longo de mais de 20 anos, é compreensível a aceitação do acordo, que retirou parte de sua terra, com o propósito de liberar a possibilidade de se homologar o restante. Dessa forma, é importante destacar o protagonismo do povo Tapeba nas mais diversas mobilizações pela conquista da terra. Mesmo em um processo complexo e longo, eles se mantiveram fortes, a fim de ter a homologação da TI e a extrusão concretizadas.
Links:
- associação para desenvolvimento local co-produzido. [2018]. Tapeba. Disponível em: http://adelco.org.br/centro-documentacao/terra-indigena-tapeba/. Acesso em: 15 mar. 2020.
- associação para desenvolvimento local co-produzido. 2019. Situação dos povos indígenas do Ceará. Fortaleza. Disponível em: http://adelco.org.br/wp-content/uploads/2019/08/Livro_Diagn%C3%B3stico.pdf. Acesso em: 31 out. 2019.
- souza, Oswaldo Braga de. 2017. Terra Indígena Tapeba (CE) é a primeira declarada pelo governo Temer. São Paulo, Instituto Socioambiental, 5 set. Disponível em: https://www.socioambiental.org/pt-br/noticias-socioambientais/terra-indigena-tapeba-ce-e-a-primeira-declarada-pelo-governo-temer. Acesso em: 15 mar. 2020.
Povo(s) impactado(s) | Tapeba |
Terra(s) Indígena(s) impactada(s) | Tapeba |
Estado | CE |
Região | Metropolitana |
Município | Caucaia |
Período da violação | 18/03/2020 |
Tipo(s) de população | Urbana Semiurbana Rural |
Fonte(s) das informações | Livro Site |
Outras fontes | Entrevista via WhatsApp com a liderança João Kennedy Tapeba, coordenador da Articulação dos Jogos Indígenas Tapeba (AJIT) |
Causa(s) da violação | Conflito por terra |
Matérias específicas | Terra |
Empresa(s) e entidade(s) do governo | Família Arruda Coelho |
Atores governamentais relevantes | Prefeitura Municipal de Caucaia, Governo do Estado do Ceará, Defensoria Pública, Ministério Público, Ministério da Justiça (MJ), Fundação Nacional do Índio (Funai). |
Tipo(s) de financiamento | Nacional Público |
O estado da mobilização diante da violação | Alto (mobilização generalizada, em massa, violência, prisões etc.) Médio (protestos de rua, mobilização visível) |
Grupo(s) que se mobiliza(m) | Cientistas/ profissionais locais Organizações locais Governo local/ partidos políticos Grupos indígenas ou comunidades tradicionais Pastoralistas |
Impactos ambientais | Visíveis |
Impactos na saúde | |
Impactos socioeconômicos | Visíveis |
Avanços positivos no processo de violação | Demarcação da Terra Indígena (TI) Tapeba e assinatura de acordo para recuperação das margens do rio Ceará; realocação de famílias indígenas que estavam em áreas de risco; implantação de saneamento básico; construção de casas, escolas e postos de saúde. |
Avanços negativos no processo de violação | Redução de 10% na extensão da Terra Indígena (TI) Tapeba, o que equivale a 544 hectares |
Alternativas viáveis para a solução da violação | Celeridade para a conclusão da demarcação da Terra Indígena (TI) Tapeba e extrusão dos ocupantes não indígenas. |
Data de preenchimento | 18/03/2020 |