Meu nome é IREKRAN KAIAPÓ, sou da etnia KAIAPÓ nascida na aldeia Kukenkrãnkei Terra indígena Kaiapó Pará filha de Kubenhikaiti Kaiapó e Patnhore Kaiapó, morei na aldeia Aukre com meu falecido marido Paulinho Paiakan depois fomos morar em nossa pequena aldeia chamada Krenhiedjá ou Rio Vermelho como é conhecida pelos kubens, temos 4 filhas. Vivi e vivo dentro de minhas tradições desde o nascimento e é através da minha cultura que expresso minha arte da pintura corporal, grafismo em telas e tecidos, também sou artesã eu faço brincos, pulseiras e colares de miçanga.
Recentemente fiz um grafismo em uma tela e é sobre ela que irei falar. Esta tela me deu oportunidade de exteriorizar um pouco o meu luto pela perda de meu marido. Como havia dito antes vivo dentro de minhas tradições e minha tradição rege que uma pessoa que perde seu marido, esposa ou filho deve passar por um longo período de luto, sem levantar a voz e sempre falando baixinho, sem falar em público ou mostrar sua imagem e algumas coisas que não devemos fazer e estes atos demostram respeito com seu ente querido que se foi, portanto essa foi a maneira de externar a minha dor, o meu carinho, meu amor e luto pelo meu marido. Levei alguns dias para finalizar a pintura, pois meu luto era muito recente e a cada vez que eu me lembrava do meu marido eu parava e chorava muito.
O grafismo que fiz nesta tela chama-se NGOKONTIRE e esta era uma pintura que nossas antepassadas mulheres Kaiapos do Kubenkrankei usavam em nossa festa tradicional chamada MENIRE BIOK que é uma festa só para mulheres, mas ela não era mais usada e acabou ficando esquecido até que antes do Encontro de Altamira em 1989 meu marido Paiakan achou uma foto antiga de uma Mebengokre antepassada usando esta pintura e ele se recordou de quando era criança e assistia a festa e as mulheres usavam esta pintura, foi quando ele pediu que eu o pintasse para homenagear as mulheres e nossas tradições que haviam ficado esquecido com o tempo, foi uma forma que ele viu de resgatar nossa tradição diante de todos que estariam presentes naquele encontro. A partir de então nosso povo voltou a utilizar esta pintura agora não só mulheres assim como homens também utilizam.
Escolhi este grafismo não só pelo que ela representa em minha cultura, mas também para homenagear meu marido, que não pude pintar seu corpo pela ultima vez, conforme minha cultura.